domingo, 15 de julho de 2012

A Santa dos Bailarinos Suicidas




Ave Maria, desculpe por não ser mais teu filho, mas cansei de esperar por milagres, eu não sei se é pecado falar a verdade, é incomum ver alguém rezar por pessoas de origens duvidosas...
Eu sei que não sou mais nada, além desse, corpo eu era espírito, hoje me movimento, pois me dá prazer, eu sou um bailarino torto que busco em coisas sagradas sacrificar meu rancor...
            É impossível definir o destino, pois nunca vivi nele, vivo por que sou matéria e de alguma forma o sobrenatural aquece meu pensamento sólido fazendo diluírem-se as coisas insatisfatórias...
               

Era uma longa estrada escura, nela se encontrava toda a luz das alegrias passadas, ela não tinha forma alguma, era somente feita de suspiros e entre um suspiro e outro se ouvia uma voz bem clara dizendo: - Esse é seu mundo!
                Sei que estava bem mais perto que voz era aquela, quando enfim a vi, vi que ela era normal, pelo menos aparentava ser, ela vestia um longo manto negro que refletia uma luz negra que me cegava olha-la tanto, sua pele era tão clara quanto à luz brilhante da lua na penumbra da noite numa noite de lua cheia, seu rosto não sei descrever muito bem, mas ela olhos bem escuro, e nada havia nele a não ser preto, em sua mão, ela segurava algo que parecia um livro, ela me mostrou suas páginas todas elas eram pretas sem escrita alguma, na última página lembro ter visto “Não acredito em nada, nem no concreto, nem no abstrato, só acredito em sonhos e pesadelos, se é que eles existem...”
                Eu sabia que dali em diante minhas danças não teriam mais sentido pra ninguém, a não ser pra quem fosse dotado de inteligência demais para saber o que se passa por trás da farsa da “alegria” que todos fingem ter.  Ela se movimentava  como uma nuvem, hora ela estava de uma forma hora de outra, e tudo acontecia tão lento que bastava eu piscar um olho que ela já tinha se desfeito toda e estava num lugar bem distante de mim.
                Ela enfim sumiu, na verdade acho que ela se desintegrou no espaço escuro que estávamos.
Eu fechei meus olhos, eu sei que era um confronto todos as sensações que estava sentindo naquele momento, mas preferi  ficar com os olhos fechados, olhos fechados não conhecem o mundo. Permaneci estático durante um bom tempo, quando enfim abri os olhos estava numa sala que aparentava não ter começo nem fim, mas davam pra ver janelas de vidro que pareciam brotar do chão e confundir-se com as nuvens, até então achava que estava só, mas quando me dei conta tinha três seres ali, um em cada canto e todos se moviam harmoniosamente a cada gesto meu, como vi que tudo o que eu fazia, pensei em ir ao centro da sala, ali cada passo  parecia ser uma eternidade a caminho do céu. Fiquei em frente a eles, eles não tinham forma alguma, só dedos enormes. Voltei para onde estava, fiquei andando pelo espaço que de tão vazio tinha dificuldades em andar por causa das barreiras que o nada constrói dentro de cada pessoa. A luz era tão fraca que quase não dava pra ver o outro lado da vida, não era deserto, ártico, antártico, estava somente cheio de nada. As “coisas” ainda estavam ali, às vezes eu ficava pensando o que era aquilo, cheguei  a conclusão que mostravam o que eu estava sentindo naquela hora: nada. Imagina, se a representação do nada de cada pessoa parecer uma figura incrível, como será quando essa mesma estiver sentindo algo...
Ali não tinha tempo, eu sempre fiz do tempo meu objeto sagrado, então era como se eu estivesse morrendo e nascendo várias e várias vezes. Sentei-me, adormeci, sonhei, não sei se era realmente um sonho, aliás, ali tudo parecia ser tão real, enfim sonhei estar na beira de um lago com águas cristalinas, ouvia-se bem o som do cantar dos passarinhos, ouvi também uma música longe bem alegre, tirei minha roupa e banhei no lago, nesse lago não havia uma criatura sequer, eu conseguia respirar facilmente nele, mergulhando adentro do lago ainda estava eu, cada vez a luz ia sumindo, e ouvi a mesma voz de antes, falando as mesmas coisas, tentei subir, em vão, a água de alguma forma tentava me levar pro fundo. Eu pensava que estava sonhando, mas aquele lugar era como a morte, a cada vez que me deixava levar pelo sono, era uma vida inteira perdida.

         Continuei descendo e descendo, parecia que o centro da Terra queria engolir-me, de repente ao meu redor se formou pequenas luzes que pareciam estrelas, acho, uma hora dessas meu coração estava disparado como se eu tivesse correndo em cima de uma serpente, a última sensação de tudo isso que lembro foi uma de como se eu estivesse me expremendo, abracei-me firmemente com os olhos fechados e em um segundo eu estava numa sala de dança redoado de pessoas me olhando, achei tudo estranho, uma hora num lugar, outrora n’outro, eu não sei se realmente estava no mundo, na lua, sonhando, morto... só me posicionei no canto da sala para ver o ensaio geral e de repente meu corpo por si próprio começou a movimentar-se, eu de alguma forma sabia toda aquela coreografia, ela era simples, triste, tinha um certo suspense e terror nela toda, eu olhava todas as pessoas no espelho, menos eu. O ensaio acabou todos saíram, eu fiquei lá. Fiquei confrontando o espelho por várias horas, do nada veio a ideia de tocar o espelho, meu dedo passava pra dentro do espelho. Meu corpo continuou penetrando o espelho, primeiro o braço todo, depois o resto corpo. Ali já era totalmente diferente, via-me refletido por todo lado que olhava, eu ia de encontro com o infinito. Eu dava passos, quanto mais eu andava pra frente mais eu ficava longe de mim, aquilo me deixava sem fôlego, eu fiquei com falta de ar durante alguns segundos. Resolvi andar de costas, é lógica, se você não consegue encontrar alguma coisa num futuro distante, talvez é porque já se deixou num passado esquecido. Pronto, precisei somente de sete passos para trás pra recuperar a respiração e sair daquele espaço, que não sei se era realmente uma ilusão.
         Deparei-me com o fogo, só sei que não era o inferno, não tinha gritos, gemidos, sequer uma fala, o único som estrondoso, imenso, aterrorizante, horroroso que havia no ar, era somente o fogo queimando – não sei o que, mas continuava queimando. Ali foi o único lugar que em todas minhas vidas me senti mal, eu não me permitia ficar ali, era claro demais pro meu globo ocular, parece que cada vez que abria-os eles derretiam sem o fogo trisca-los. Olha que tudo isso que passei pareceu ser uma grande aventura, então se nada podia acontecer comigo me joguei no fogo, veio todas as lembranças boas naquele momento, elas pouco a pouco foram se apagando da minha mente, eu queimei por completo.
Assustei-me com aquela multidão, todos olhando pra algo que estava em cima do palco logo à frente, tentei me colocar à frente, a briga por espaços eram constantes, pedi de todas as formas, de licenças a empurrões fui chegando cada vez no palco. Uma cena constrangedora vi ali, havia uma pessoa enforcada, os três seres estavam a frente do palco bebendo o sangue que derramava pelos punhos daquela pessoa que com certeza foi cortado pela voz ou mulher ou seja o que fosse, ela me olhou  fixamente e veio a meu encontro planado no ar, me levou até o palco, me mostrou ao público, mas não sei se realmente eles nos olhavam, fixei meu olhar naquela pessoa, tomei um susto, era eu morto, as lágrimas nessa hora derramaram lentamente uma por uma em meu rosto, ela me olhou de novo e riu, era lindo ver seu sorriso naquele momento de dor. Ela me deu as mãos, saímos andando por cima das pessoas, eu só tinha que fazer uma coisa naquele momento, esquecer que eu tinha existido.

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